Assembleia Plenária da Conferência Episcopal Portuguesa 1. Queridos Jovens: A XV Jornada Mundial da Juventude, realizada em Roma no passado mês de Agosto, foi um grande acontecimento de Igreja. Muitos de vós participastes nela e outros acompanharam-na pelos meios de comunicação social. Queremos fazer-nos eco desse grande acontecimento do Jubileu dos Jovens, e do que vos disse e diz o Santo Padre. João Paulo II traçou-vos, de modo incisivo e claro, o verdadeiro horizonte de um compromisso de fé. E enviou-vos em missão “como sentinelas da manhã, nesta alvorada do terceiro milénio”, para anunciardes a todos os outros jovens Jesus Cristo, nosso Salvador, Aquele que guarda o segredo do sentido da vossa vida e da construção de um mundo novo, dinamizado pela esperança, e alicerçado numa autêntica civilização do amor. PERGUNTAS QUE SÃO RESPOSTAS 2. Sem esquecer as muitas questões que, tantas vezes, se atropelam no coração dos jovens sobre o seu futuro, sobre o bem e o mal, sobre o sentido da liberdade num mundo complexo e dispersante, sobre a vida e sobre a morte, sobre o valor do amor e da amizade, da fidelidade e da generosidade, sobre Cristo e sobre a Igreja, em última análise sobre Deus, a sua existência ou não existência, o Santo Padre confronta os jovens com três perguntas que, desde o Evangelho, há dois mil anos, interpelam todos os discípulos de Jesus: Quem procurais? Quem dizeis que Eu sou? Para quem devemos ir? A resposta a estas três perguntas levar-vos-á ao encontro de Jesus. * Quem procurais? (cf. Jo 20, 15). Não vos foi perguntado: “O que é que procurais?” Essa é a tentação de muitos jovens do nosso tempo, de gastar as suas energias e esgotar as suas iniciativas em busca de coisas deste mundo, de situações materiais, de um futuro efémero, de uma felicidade precária, não percebendo que só interessa procurar uma pessoa, Jesus Cristo. O vosso cristianismo, queridos jovens, não pode basear-se apenas numa tradição: tem de alicerçar-se neste encontro pessoal com o Senhor. Esse encontro dá sentido à vida, revela a harmonia da criação e desvenda o segredo de uma fidelidade pessoal, que enobrece a liberdade e atrai para o horizonte insondável do amor infinito de Deus. 3. Mas o Santo Padre confrontou os jovens com uma outra pergunta, que o próprio Jesus fez aos seus discípulos: “Vós quem dizeis que Eu sou?” (Mt 16,15). Jesus faz esta pergunta aos discípulos que já O tinham seguido. A eles Jesus quer revelar mais intimamente o Seu mistério. Ele sabe que só assim, conhecendo-O profundamente e aprendendo a amá-l’O, eles continuarão a segui-l’O. Caso contrário, o primeiro entusiasmo esmorecerá, abafado nas solicitações do mundo, como a semente que caiu nos espinhos, germinou, mas não cresceu, definhou (cf. Mt 13, 20). Depois da confissão messiânica de Pedro, Jesus atribui esse conhecimento mais profundo de Si mesmo a uma revelação de Deus Pai. Noutra altura Jesus dissera-lhes: “Só o Pai conhece verdadeiramente o Filho” (Mt 11, 27). Este é, queridos jovens, o processo de crescimento da fé. Nele entram muitos elementos: a revelação de Deus, as nossas dúvidas e hesitações, a exigência de viver de acordo com a palavra do Senhor, respondendo ao amor que nos tem, os acontecimentos da nossa vida, que vão exigindo respostas de coerência cristã. A todo este processo o Santo Padre chama, simbolicamente, o “laboratório da fé”. O Papa refere, ainda, uma outra passagem evangélica, que nos situa perante uma etapa mais radical deste processo vivo da fé: o diálogo entre Jesus ressuscitado e Tomé, o discípulo incrédulo (cf. Jo 20, 26-29). Aí temos o confronto entre a dificuldade de acreditar na ressurreição de Jesus, e a veemência espiritual da manifestação do Ressuscitado. Não há maturidade da fé sem acreditar que Jesus está vivo, e sem mergulhar na vida nova do ressuscitado. O Cristo que hoje nos pode seduzir e com Quem podeis estabelecer uma relação de amor e de fidelidade é Cristo ressuscitado, vivo na Sua Igreja. 4. O Papa sugere aos jovens a etapa decisiva desta caminhada, colocando-lhes a terceira pergunta: “Senhor, para quem devemos nós ir? Tu tens palavras de vida eterna” (Jo 6, 68). No Evangelho esta pergunta situa-se num momento particularmente exigente na decisão de continuar a seguir Jesus: aceitar o discurso de Cristo, verdadeiro pão da vida, o mistério da Eucaristia. Perante as palavras de Jesus, revelando a Sua identificação com o pão eucarístico, muitos dos que já O seguiam abandonaram-n’O. Mas sobre o mistério do “pão da vida”, Jesus não está disposto a ceder. Arrisca mesmo o afastamento dos mais íntimos. Volta-se para os discípulos e pergunta-lhes: “Também vós quereis retirar-vos?” (Jo 6, 67). O mistério da Eucaristia surge como a questão crucial e decisiva de uma caminhada de fé. Aceitá-lo como sacramento pascal, como momento em que cada um de nós pode fazer a experiência do encontro vivo com o Ressuscitado, é aderir a Jesus Cristo e ao Seu projecto de vida, para toda a eternidade. “Só Tu tens palavras de vida eterna”. Queridos jovens! A vossa adesão a Jesus Cristo só será definitiva se experimentardes encontrá-l’O na Eucaristia, sinal da Sua presença e do Seu amor, até ao fim. Diz o Santo Padre: “A Eucaristia é o sacramento da presença de Cristo que Se dá a nós, porque nos ama. Ele ama cada um de nós, de maneira pessoal e única. Cristo ama-nos sempre, mesmo quando o desiludimos, quando não correspondemos às suas expectativas a nosso respeito. Nunca nos fecha os braços da Sua misericórdia”. RESPOSTAS QUE COMPROMETEM A VIDA 5. Responder a estas três questões, aceitando seguir Jesus, arriscar o processo purificador da fé, para melhor O conhecer e aceitar ser conduzido por Ele até ao âmago do mistério pascal, exige uma renovação de vida. O Papa foi claro: para ser fiel a Jesus Cristo, é preciso ter a coragem de “ir contra a corrente”. Essa coragem precisa da audácia dos santos e da radicalidade do martírio, expressa nas situações da vida que partilhais com todos os outros jovens. É preciso ser diferente no modo de amar. A todos os jovens, tanto aos namorados, como aos jovens casados e àqueles e àquelas que escolheram o caminho da virgindade, o Papa lembra a coragem de um amor casto e puro, pois só assim o amor será gratuito, generoso, expressão do amor com que Cristo nos ama. É preciso ser diferente na relação com o dinheiro e os bens materiais, que não devem aprisionar o nosso coração, mas ser instrumento de amor fraterno. É preciso ser diferente na luta pela paz, vencendo toda e qualquer tentação de violência, praticando na nossa vida de relação com quem nos está próximo os ideais que proclamamos acerca da paz. É preciso ser diferente na maneira de conceber a vida como um serviço, o sucesso e a realização pessoais como um contributo para a edificação de um mundo mais justo e mais fraterno. Sublinhando o carácter heróico da existência cristã, o Santo Padre pergunta: “Queridos jovens, num mundo assim, é difícil acreditar? No ano dois mil é difícil acreditar? Sim, é difícil. Não vale a pena escondê-lo. É difícil, mas com a ajuda da graça é possível”. 6. A oração é a manifestação mais autêntica de que vivemos a nossa vida em intimidade com Deus, por Jesus Cristo. A interpelação do Santo Padre aos jovens, neste sentido, é muito forte: “Deixai-vos plasmar pelo Espírito Santo. Fazei uma experiência de oração, deixando que o Espírito fale ao vosso coração. Rezar significa dar um pouco do nosso tempo a Cristo, entregar-se a Ele, permanecer em escuta silenciosa da Sua Palavra, fazê-la ressoar no coração”. É próprio dos jovens serem utópicos, terem um coração que não conhece limites e deseja o infinito. Queridos jovens, na perspectiva cristã esse anseio de infinito concretiza-se no ideal da santidade. A evangelização dos jovens, neste início de um novo milénio, precisa de rapazes e raparigas com ideal de santidade. O Papa convida-vos a serdes os santos do novo milénio. “Cristo chama-nos para sermos Seus. Quer que todos sejam santos. Caros jovens, tende a santa ambição de ser santos, como Ele é Santo”. 7. Crescer na fé, em ordem a esta radicalidade, é descobrir a Igreja, onde caminhamos de mãos dadas, irmanados na fraternidade, enriquecidos com todas as manifestações do amor de Cristo por nós, através do calor do Seu Espírito. A aventura da fé é um caminho que não se percorre sozinho. João Paulo II lembra isso: “Queridos jovens, em tarefas tão nobres não estais sozinhos. Convosco estão as vossas famílias, as vossas comunidades, estão os vossos sacerdotes e educadores, estão tantos de vós que, sem fazer alarde, não se cansam de amar a Cristo e de acreditar n’Ele. Na luta contra o pecado, não estais sozinhos: muitos como vós lutam e, com a graça do Senhor, vencem”. Na Igreja a vitória de uns é fonte de coragem para outros. A Igreja é esse rio caudaloso de vida que atravessa os séculos, em cuja corrente mergulhamos, enriquecendo-a para um futuro novo. Não estamos isolados; recebemos a força dos que nos antecederam, procuramos ser fiéis no presente e isso lança-nos para a missão, pois esta torrente continuará a atravessar o tempo, até à eternidade. INVENTANDO CAMINHOS DE EVANGELIZAÇÃO 8. Este envio em missão, no âmago da nossa vivência eclesial, convida-nos a todos a sermos inventivos no encontrar novos caminhos de pastoral para a evangelização dos jovens. Não é aqui o lugar de propor um plano elaborado para a pastoral juvenil em plano nacional. Mas podemos tomar consciência de algumas linhas de força que emergem destas jornadas mundiais, que exigem de nós que as prolonguemos no espaço e no tempo, em cada uma das nossas Igrejas Diocesanas. Antes de mais, a solicitude pastoral do Santo Padre pelos jovens recorda-nos a nós, Pastores, que somos os primeiros evangelizadores dos jovens. Queridos jovens, queremos repetir-vos hoje que podeis contar com a nossa solicitude, o nosso empenho pastoral, com a disponibilização dos sacerdotes necessários para vos acompanhar na vossa caminhada de descoberta e de fidelidade a Jesus Cristo. Mas contamos também convosco. Precisamos da vossa iniciativa, da vossa generosidade, do vosso ideal. Precisamos que alguns de vós aceitem o chamamento de Cristo e da Igreja, para serem sacerdotes. Não vos esqueçais que a Igreja dos próximos anos só terá sacerdotes se alguns de vós aceitarem esse chamamento. 9. Será oportuno referir as grandes características de uma pastoral juvenil que emergem destas jornadas: – uma pastoral querigmática, de primeiro anúncio. Temos de ser ousados no imaginar formas e inventar caminhos de levar o conhecimento da pessoa de Jesus Crsito a todos os jovens, nas escolas, nas famílias, nos ambientes de trabalho; – uma pastoral catequética, que proporcione a todos que o desejarem um conhecimento mais profundo do Senhor. Não tenhais medo da palavra; é precisa uma catequese para os jovens, que lhes proporcione um aprofundamento doutrinal, uma experiência de oração e de serviço dos irmãos; – uma pastoral missionária, que apoie os jovens na escolha dos caminhos de radicalidade, na busca da santidade, na disponibilidade para vocação de total entrega ao Reino de Deus, e os faça experimentar o zelo e alegria da missão; – uma pastoral encarnada, que tenha em conta o realismo da vida dos jovens de hoje, que os apoie no seio das realidades da sua existência, ajudando-os a reagir aos acontecimentos com discernimento cristão; – uma pastoral eclesial, que ajude os jovens a descobrir, no concreto, a força de pertencer a uma comunidade de fé. Cada Diocese, com o seu Bispo à frente, é o espaço apropriado para pensar e dinamizar a pastoral juvenil. O plano nacional só pode significar a convergência entre as diversas Igrejas, a busca da unidade, na pluralidade das realidades e dos caminhos escolhidos, na entreajuda das diversas Igrejas, na descoberta contínua da dimensão da universalidade. Em ambiente de colegialidade e aceitando a corresponsabilidade desta bela missão de evangelização dos nossos jovens, comprometemo-nos a reforçar sempre mais as estruturas nacionais de pastoral juvenil, de modo a poderem tornar-se apoio eficaz às diversas Dioceses. 10. Nós e vós colocamos estes nossos anseios e a exigência da nossa missão sob a protecção de Maria Santíssima, Mãe da Igreja. Queridos jovens, nesta aventura de anunciar, conhecer e amar Jesus Cristo, há uma cumplicidade espontânea com Maria, Sua Mãe. Ela ensina-nos o caminho. É impossível amar Jesus Cristo sem amar Nossa Senhora. Concluimos esta nossa breve mensagem com palavras do Papa João Paulo II: «Maria é a aurora que precede o surgir do Sol da justiça, Cristo nosso Redentor. Com o ‘sim’ da Anunciação, ao abrir-se totalmente ao projecto do Pai, Ela acolheu e tornou possível a Encarnação do Filho. Primeira entre os discípulos, com a sua presença discreta acompanhou Jesus até ao Calvário e sustentou a esperança dos Apóstolos, à espera da ressurreição e do Pentecostes… Maria Santíssima vos ensine, caros jovens, a discernir a vontade do Pai celeste para a vossa existência. Obtenha para vós a força e a sabedoria, a fim de poderdes falar a Deus e de Deus. Que o seu exemplo vos incentive a ser no novo milénio anunciadores de esperança, amor e paz». Fátima, 16 de Novembro de 2000